terça-feira, 28 de janeiro de 2014

A destruição da infância: Vicenç Navarro


A destruição da infância

Está acontecendo algo muito grave que não vem sendo debatido: uma grande deterioração do meio cultural no qual as crianças estão submersas.

Vicenç Navarro (*)

Está acontecendo algo sobre o qual não se comenta muito nos fóruns midiáticos e políticos do país (Espanha), e que está causando impacto enorme na qualidade de vida em nosso presente e em nosso futuro. Estou me referindo à grande deterioração do meio cultural no qual a criança está submersa. Um indicador disso, entre outros, é o mundo midiático ao qual as crianças estão expostas. E não me refiro somente ao número de horas que passam diante da televisão ou de outras mídias de entretenimento, o que continua sendo um problema grave (nos Estados Unidos, onde este tipo de estudo é sistematicamente realizado, o tempo de exposição subiu de uma hora e meia nos anos 1970 para cerca de quatro horas atualmente). Estou me referindo, além do tempo de exposição, à evidente deterioração dos conteúdos de produção midiática. A destruição no conteúdo educativo dos programas televisivos ou dos videogames tem sido eminente, com um aumento notável da promoção do consumismo, do individualismo, da violência, do narcisismo, do egocentrismo e do erotismo como instrumentos de manipulação.

A evidência de que isto se dá dessa maneira é assustadora. Estes conteúdos – que configuram de forma muito negativa os valores sociais – estão espalhados por toda a sociedade, incluindo os adultos. Mas o que é ainda mais preocupante é que muitos desses valores se apresentam com mais intensidade nos programas voltados para o público infantil. E a situação está piorando. Vou me explicar.

Em meados da década de 1970, foi feito um estudo sobre o conteúdo dos programas de televisão para meninos e meninas nos EUA. Foi realizado por pesquisadores da Johns Hopkins University. Nesta pesquisa, constatou-se que a violência, muito generalizada nos Estados Unidos, estava inclusive mais presente, paradoxalmente, na programação infantil. Tal estudo provocou uma revolta considerável naquele país. E fui eu a apresentá-lo no Congresso dos EUA, não enquanto professor realizador do estudo, mas como dirigente da Associação Americana de Saúde Pública (American Public Health - APH, segundo a sigla original), tendo sido escolhido entre o corpo diretivo pelos 50 mil membros dessa Associação.

O Comitê de Assuntos Sociais do Congresso dos EUA organizou uma série de depoimentos para analisar o que estava acontecendo nos programas de televisão orientados para crianças. E convocou uma sessão em que estavam, de um lado, os presidentes das três cadeias de televisão mais importantes do país (CBS, ABC e NBC) e, de outro, o representante da APHA (que era eu). Para sempre me lembrarei daquele momento. Ali estava eu, filho de La Sagrera, bairro popular por excelência de Barcelona, Espanha, com o enorme privilégio (em um país de imigrantes) de representar meus colegas da APHA e defender os interesses da população norte-americana diante de três das pessoas mais poderosas dos EUA, que durante seu depoimento tentavam ridicularizar o meu, alegando que eu estava exagerando quanto ao impacto desses programas nas crianças norte-americanas.

Como não podiam questionar os dados que documentavam a enorme violência dos programas infantis, centravam-se em negar que tiveram impacto nas crianças. Este argumento foi fácil de destruir, com a pergunta que lhes fiz diante do Congresso:

“Se vocês acreditam que seus programas não têm impacto entre as crianças, por que cada anúncio comercial que aparece nestes programas custa quase um milhão de dólares?”. Não responderam. Negar que tais programas tenham um impacto nos espectadores é absurdo. O Congresso dos EUA, por certo, não fez nada, pois não ousava contrariar estes grupos poderosos.

A situação está se deteriorando

E a situação está inclusive pior atualmente. Esta fixação infantil pela mídia audiovisual está amplamente estendida, agora por meio dos videogames, que estão substituindo a televisão. O grau de exposição das crianças aos videogames alcançou um nível que ultrapassa em muito o tempo à frente da televisão. A transmissão dos valores por meio dos jogos eletrônicos, citados anteriormente, é massiva. É o equivalente ao fast food no universo psicológico, cultural e intelectual.

Tanto que, em vários países europeus, se considera proibir a importação de videogames dos EUA (que são extraordinariamente mais violentos), que destroem massivamente meninos e meninas. Acredito que as autoridades públicas espanholas deveriam considerar sua proibição, como já acontece em vários países da Europa.

Porém, para além da destruição que muitos desses videogames provocam na infância, a exposição a essa cultura tira as crianças de outras atividades. Existe evidência de que, quanto maior o tempo dedicado aos videogames, menor é a capacidade de leitura e de compreensão de textos. A leitura de livros – dos clássicos da infância, de Heidi ao Pequeno Príncipe – está diminuindo muito rapidamente. Serei criticado sob a alegação de que este texto denota nostalgia, o que não é certo, pois minha crítica não é ao fato de não lerem esses textos, mas sim à ausência de leitura desse tipo de texto, em que a narrativa conecta o indivíduo com a realidade que o cerca, ajudando a desenvolver uma visão solidária, amável e coletiva da sociedade. Enfatizar a força, o ego, o “eu” e a satisfação rápida e imediata do desejado, sem freios, levará todos nós a um suicídio coletivo.

E me preocupa o fato de que isto já esteja acontecendo. Se desejam ver seu futuro, vão agora aos Estados Unidos e o verão. As mudanças sofridas desde a década de 1980, quando se iniciou o período neoliberal com Reagan e Thatcher, foram enormes. O neoliberalismo, a exaustação ao "êxito" sem freios, ao individualismo, ao narcisismo, ao darwinismo, inundaram todas as áreas da cultura da infância.

As meninas como objeto sexual

Outro elemento da deterioração da cultura infantojuvenil está na reprodução dos estereótipos, por trás da qual há uma relação de poder. Um dos mais marcados é o que reproduz a visão machista da sociedade, apresentando as mulheres como objetos eroticamente desejados, e que, notavelmente, afeta a infância. Essa visão já alcançou dimensões patológicas. Nos países mais machistas (e a Espanha está no topo da lista), a mulher está sempre muito decotada (e cada vez mais) e, se não, vejam os noticiários diários. Por que os homens não vão decotados à televisão quando dão as notícias, mas sim as mulheres?

A imagem erótica, com uma definição de beleza estabelecida pelo homem, está alcançando nível tamanho de exagero, que começa inclusive com as bonecas Barbie. Vários países europeus – como a França – estão pensando em proibir tais tipos de boneca. Está chegando a um nível que exige uma mobilização, protestando contra essa destruição por meio da promoção de valores que são prejudiciais à infância e à população em geral. Espero que o leitor se some a essas mobilizações. Se você ama seu país, sugiro que faça algo. Não deixe que manipulem nem a você, nem a seus filhos, filhas, netos e netas. Indigne-se! Faça algo!

...

(*) Professor de Políticas Públicas. Universidade Pompeu Fabra, em Barcelona, e professor da Johns Hopkins University. Site pessoal: www.vnavarro.org

Reproduzido de Carta Maior

26 jan 2014

Leia também:

"A TV psicotizante na globobocalização" (27/01/14) por Leo Nogueira Paqonawta, clicando aqui.

domingo, 26 de janeiro de 2014

Espiral Re-Evolutiva em Imagem-em-ação


Espiral Re-Evolutiva em Imagem-em-ação

Eu e tantos Vosmecês Crianças, em Companhia da Paz, comigo, nas órbitas da Mandala de Meu Universo-Vida em Comum-única-ação

Janeiro de 2014

Outras Mandalas e Personagens clicando aqui.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Espaço/Tempo da Imaginação


Audaciosamente indo onde nenhuma Criança jamais esteve... além das fronteiras, no Espaço/Tempo da Imaginação...

Gente-Curta-Metragem


Mil e Uma Ideias na Cabeça com a Mão da Infância nas Mídias...

Manifesto das Crianças


Crianças do mundo inteiro, uni-vos!

Vivemos um outro Tempo/Espaço de pás, de baldes, de regadores, enxadas, foices e martelos, de lápis multicoloridos que derrubam todas as cercas, muros e portões, de salas que  separavam os meninos e meninas de seus sonhos.

Crianças, um mundo despedaçado em ruínas espera sua chegada para que outras formas de viver em alegria re-criem a beleza para as futuras estações do Bem Viver.

Sorriam ao compartilharem suas flores, sentem-se à grama e re-criem seus brinquedos. Inspirem outras crianças adormecidas a brincarem também. Quando elas ouvirem suas gargalhadas saberão que podem se juntar à brincadeira e realizar as vontades de sua criativa imaginação.

Ah, crianças, que as manhãs de seus sonhos façam cair os véus das antigas e tristes noites de quando seus sonhos lhes foram retirados. Sejam corajosas, vivam seus ideais, despertem da sonolência que lhes foi imposta pelos contadores de uma história que lhes tirou a dignidade e os finais felizes. Em cinco pétalas e palavras: acordem, brinquem, vivam, realizem, sonhem.

Continentes inteiros esperam sua chegada, crianças, para que da terra brotem as esperanças adormecidas. As cidades mortas, as casas vazias de ternuras, as estradas poeirentas, os campos aguardam sua vinda. Espalhem-se, recriem a natureza à imagem e semelhança de suas aspirações. Que a solidez das flores se desmanche no ar em perfumes ao toque gentil de beija-flores, ao re-en-canto de passarinhos amarelos em bem-te-vis e bem-te-queros anunciando o Grande Dia.

Deixem os bancos enfadonhos das escolas que transformaram as crianças em peças de máquinas, e dispersem-se pelos canteiros em buscas e entregas na des-coberta desse Outro Mundo com seus novos amigos. Ah, crianças, abram suas asas da imaginação para se tocarem e repartirem o que têm des-coberto. Subam às árvores, iniciem hoje essas voltas na espiral do in-finito na revelação desses sonhos.

As flores e os frutos deste jardim são abundantes. Juntem-se para colher mil e um buquês em poesias perfumadas com os aromas da vida, façam suas cestas para depois irem re-partir essas alegrias plantadas e des-cobertas. Anunciem este jardim aos outros, chamem mais crianças para brincar, que estes campos são para todos. Unam-se.

Crianças, que seus corações estejam abertos para compartilhar a riqueza de ideias e ideais de cada um. Que o futuro seja re-construído a partir de seus sonhos de ventura. Com-partilhem, de mãos cheias de alegria, os abraços e cuidados para com tudo e todos. Construam, assim, seu mundo novo, vivo!

Re-inventem suas novas formas de brincar, esqueçam-se das pilhas e dos manuais de instruções de cada jogo que lhes foi ensinado. No amor e companheirismo dedicados uns aos outros poderão ser des-veladas outras maneiras de contar e fazer o mundo. Sejam livres para fazer a sua linda história de amor e solidariedade.

Brinquem, que as árvores e o jardim são de todos, e no universo in-finito a Terra é a escola para essas mil e uma aventuras e bem-aventuranças. Co-movam-se!

Meninas e meninos, tragam seus gracejos e sua vida! Venham com todos os seus brinquedos fazer casinhas nas árvores, re-encontrar uma família de irmãs e irmãos que com-partilhem a vontade de re-criar os laços de ternura e afeto nessa humanidade de seres livres para o amar brincante.

Uma outra era começa a partir de sua semeadura. Que nos canteiros de flores sejam des-marcadas todas as fronteiras de sua meninice, para que seja conquistada nessa partilha a amizade entre todos, numa só pátria de solidariedade como flor desabrochada por seus anseios.

Do mundo antigo há arvores que lhes foram mostradas lindas, como a da liberdade, a da justiça, a dos direitos e tantas outras que jamais lhes foram dadas para brincar. Mas, em seu jardim, todas as novas árvores estarão verdes na primavera de e-ternuridades para vocês balançarem em seus galhos, e se deitarem às suas sombras nos dias de calor. Venham, tragam suas sementes para plantar de novo aquela Esperança que ilumina a Vida.

Sim, isso poderá se realizar em 10 passos como no jogo de amarelinha, pé-ante-pé, indo das tristezas das paisagens que lhes foram dadas até além, onde o céu se põe em espetáculo de cores. Vamos, se abracem. Pulem! Atravessem os caminhos e a Ponte Colorida de mãos dadas. Juntem-se em “mão-nifestações” pelos quatro cantos mundo!

As crianças arrancarão de seus corações, pouco a pouco, todas as ervas daninhas que lhes foram plantadas pela tradição das escolas, como tem acontecido através dos séculos. Isso não acontecerá novamente neste maravilhoso jardim-da-infância. Com-partilhem seus lápis de cores do Arco-Íris e coloram todas as letras com suas vozes e meninices para dar outro sentido às palavras que lhes quiseram calar. Re-vira-voltem a escola pela sabedoria nesses seus voos e passos re-evolutivos!

O seu poder, crianças, está para converter a secura das paisagens em florestas e bosques perfumados de doçura e sorrisos. Desapareçam, como que por encanto, todos os seus medos quando vocês se derem as mãos para isso. Que outros saberes e fazeres re-inventem o mundo pela sabedoria que vem desse amor e espiritualidade que nos irmana a tudo e ao todo.

Borboletas, abelhas, minhocas, passarinhos, todos se aliam a favor de seus sonhos. Em lugar dos antigos blocos de cimento duro ou asfalto seco, juntem-se em suas brincadeiras para que todos possam correr livres pelos jardins e campos à espera de sua vida.

Em resumo, sejam a favor de tudo aquilo que lhes coloquem a caminho dos jardins que esperam a re-evolução nas estações com suas alegrias, com o sol, a lua, as estrelas, a chuva, o vento, o tempo/espaço das bem-aventuranças.

Crianças, coloquem em primeiro lugar, como ponto fundamental, a questão de se apropriarem de todas as terras para plantar flores e grãos com suas pás, baldes e regadores. Finalmente, unam-se para que todos as entendam em todos os países na sua língua de alegria infantil.

As crianças têm toda a infância a perder se não soltarem a imaginação e abrirem as caixas de brinquedos para libertar a Esperança como uma pandorga livre no ar. Têm um mundo a sonhar e realizar como seus.

Crianças do mundo inteiro, uni-vos!

Paqonawta

Escrito em 1986, inspirado no Manifesto Comunista de Karl Marx e Friedrich Engels, de 1948, de trás pra frente...

Re-vira-voltado em 2013, inspirado nas crianças dos quatro cantos do mundo atravessando os caminhos e a Ponte do Lápis Arco-íris, de frente pra trás, de dentro pra fora, de baixo pra cima, de fora pra dentro, de cima pra baixo, re-dimensionando nas des-cobertas desses passos e voos re-evolutivos pelo Universo in-finito.

O Espaço/Tempo decifrado...


O Tempo Decifrado

Célia Laborne Tavares

Às vezes, reconhecer o caminho pode se tornar tão doce que os amigos começam a decifrar nos teus olhos o tempo de primavera, o início da festa.

Primeiro um olhar, um espanto e a surpresa de achar teus olhos iluminados, tua voz mansa, tua palavra firme. O gesto que habita o corpo não é mais o aceno do adeus ou do desespero; antes, é um cumprimento de recém-chegado, é o aperto de mão do que está um pouco à frente.

Depois, não apenas os amigos notam a diferença, mas ela cresce e se desdobra sobre quase todos, num repartir de idéias, num comungar de passos para que todos cheguem o mais cedo possível junto à fonte.

E, quando as manhãs começam a despontar, assinalando os atalhos, para o cumprimento do amor maior, fácil é distribuir alegrias entre as sombras dos que ainda dormem; dos que estão presos ao fantasma dos sonhos da terra e de seus liames.

Quando, ainda em pleno inverno, as noites se limpam para que o sol chegue mais cedo, a comemoração é uma necessidade que atinge todos os que têm o coração preparado. Todos os que perguntaram ao silêncio germinam na espera da primeira aurora...

É tempo de renovar, de iluminar, de recriar, porque as horas estão sempre contadas para todos e, cada instante pode ser preciso no cômputo final das partidas e chegadas.

E tu, com teus olhos transparentes, sabes que são apenas preliminares da festa este anunciar de fogos, este afinar de instrumentos para iniciar a harmonia. Entretanto, mesmo assim todos começam a perceber que tu esperas a luz e já encontraste o mapa do roteiro.

Tua claridade é tão visível que mesmo os que ainda têm névoa nos olhos começam a perceber a crisálida que aflora, como conquista própria das variadas buscas.

Deixa, portanto, que as palavras, agora, sejam festas em teus lábios até ontem mudos, para que os amigos recebam o convite maduro de tuas experiências. Deixa que expandam tuas vitórias, para que elas sejam compartilhadas.

De repente, reconhecer o caminho, pode confortar e ampliar as responsabilidades, como se as sementes houvessem sido postas em tuas mãos para serem usadas em terreno próprio e tempo justo.

Por isso, aguarda o início do canto para que as intensas vibrações do amor propaguem-se perto ou longe de tua morada; pois não importa quanto e quem deva começar a colheita de teus frutos.


A pérola está a teu alcance.

...

In, O Quinto Lótus
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